sábado, 14 de março de 2015

Noite de lamparinas

Na noite em que a rua tanto ecoa
organizo, emudecida, lamparinas
projetando no interior de minha casa
as sombras de tua ausência que a habita.

Alinho cada peça de viagem
eis que a partida
embora longe
se aproxima.

Enquanto durmo
sinto teus olhos à espreita
embora em sonho, eu, suçuarana destemida,
encare a realidade fria.

Da despedida, trago planos quase etéreos
e respostas a pedidos infundados
não sei o que a distância vaticina
mas eis atado teu caminho à minha vida.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Apontamentos de uma mulher senil

Trago um cansaço de séculos.
Como uma anciã
ponho-me a contemplar
os infantes
que, em sua inocência,
cuidam da busca incessante
das palavras que definam
as palavras que revestem
o sentir.

Em lugar de apreciar
as contradições do vinho ao encontrar mornas papilas
descrevem – mecânicos –
as sensações enciclopédicas da enologia.

Em lugar de pousar os olhos
em paisagens nunca dantes vistas
tratam de aprisioná-las
em afoitas fotografias
das quais a beleza
se verbaliza.

Em lugar de degustar
a maciez de lábios
o arrepio ao toque
pronto declaram
em rede mundial
amor eterno (enquanto dure).

E em uma vida restrita
a verbetes de dicionário
os infantes não percebem que
Felicidade, Amor,
jamais serão compreendidos:
enquanto palavras.